quinta-feira, 15 de dezembro de 2011

ter ou não ter (um blog): eis a questão.

Vou te falar que os momentos que eu sinto vergonha deste blog são maiores do que os que eu sinto orgulho.
Ainda assim, persisto em mantê-lo e, muito esporadicamente, em acrescentar algum texto.
Isto aqui é um atestado de como eu mudo de estilo e de opiniões rapidamente. Chega a ser dolorido ler um texto que eu escrevi em 2007. Nestas horas, vergonha. Mas não tenho coragem de corrigir uma passagem fora de concordância ou outra que eu, agora, julgue mal escrita. Seria como usar o photoshop para retirar as espinhas que aparecem na minha testa nas fotos de quando eu tinha 16 anos.
Da mesma forma que achamos engraçado, embaraçoso, olhar o próprio álbum de fotos da formatura do colégio, ler uma composição antiga é também meio bizarro. Mas é legal.
Fica a dica para quem gosta de escrever, pintar, desenhar, compor músicas, etc.: guarde suas criações e as veja no futuro.

jeitinho brasileiro

Brasileiro tem uma forte inclinação à anti-democracia. É impressionante.


Frases recolhidas do meu cotidiano:


"É, agora temos que tomar cuidado com essas piadas: Dá cadeia, né? Até nego agora temos que respeitar, vê se pode..."


"Agora que qualquer pé-rapado pode comprar carro o trânsito fica assim... É um absurdo!"


"Ah, também, agora pobre pode andar de avião, né? Aeroporto virou rodoviária, é uma tristeza aquele povão todo..."


"Até a viadagem foi permitida, agora! Onde é que vamos parar?"


Em um almoço de família (que naõ era da minha família) alguém comentou que viu um casal de gays de mãos dadas. Os demais lamentavam: "aah não.... Que absurdo! Que desagradável".


O brasileiro sempre viveu na desigualdade. Não entende que sociedade desenvolvida é sociedade igual. Quem está na classe dominante (seja social, sexual, racial) não quer assistir a ascensão do sujeito que julga inferior.


O brasileiro ainda está se acostumando, lentamente, com a democracia e com os direitos humanos.


Às vezes essas reflexões freiam meu otimismo quanto ao nosso desenvolvimento.

quarta-feira, 14 de dezembro de 2011

For(ç)a Haole!!!

Apenas pequenos grupos de índios Carijós povoavam a área onde hoje se conhece por Florianópolis, em meados de 1500. Uma disputa política do outro lado do Oceano Atlântico, contudo, haveria de mudar para sempre a história desta ilha.
                Portugal e Espanha estavam disputando as terras da América do Sul e, após os tratados de Madri, Santo Idelfonso e outros das aulas de história que eu não me lembro, acertou-se, pelo Tratado de Tordesilhas, que o território português se estenderia até onde hoje é a cidade de Laguna. Para que as expedições espanholas chegassem até seus territórios mais ao sul (atuais Argentina e Uruguai), portanto, era necessário que se percorresse a costa brasileira.
                Não tardou para que os desbravadores espanhóis descobrissem uma ilha muito próxima ao continente, com uma baía de águas mansas, vegetação exuberante e abundância de água, animais e frutas em pleno território português. A Ilha de Santa Catarina tornou-se um ponto de parada perfeito para abastecimento e descanso em segurança dos espanhóis que seguiam viagem ao sul.
                Não se sabe, ou eu é que não sei, como era a convivência dos índios Carijós com os primeiros descobridores de Florianópolis. Mas, sabe-se que o povo Carijó foi amistoso, tranquilo nas relações que tiveram com europeus em outras regiões em que viveram.
                Também não tardou para que a coroa portuguesa soubesse da ousadia espanhola em ocupar um território que lhe pertencia. Preocupada com o vazio demográfico do sul do Brasil, Portugal passou a incentivar os movimentos bandeirantes, isto é, caravanas oriundas do centro do país para colonizar e povoar o sul do território Português.
                Ao final de 1600 chegou por aqui o paulista Francisco Dias Velho (não coincidentemente, o nome do primeiro viaduto de quando se cruza a ponte nos dias de hoje), que fundou Nossa Senhora do Desterro. Na verdade, eu não sei se ele deu este nome, mas foi assim que a então vila passou a ser chamada nos anos seguintes.
                Mesmo que algumas famílias de paulistas e vicentistas passaram a habitar a Ilha de Santa Catarina, os espanhóis continuaram utilizá-la como ponto de parada, até que Portugal decidiu equipar a Ilha militarmente. Deslocou um contingente do exército, vindo do Rio de Janeiro e mandou construir 4 fortes e (se não me engano) 3 fortalezas. Apenas a fortaleza de Sant’Ana não existe mais. Era uma intimidação à Coroa Espanhola que, mesmo assim, anos depois invadiu a Ilha e a dominou. Se você ficou interessado por esta passagem histórica, faça o passeio de barco para a Ilha de Anhatomirim. Lá é explicado detalhes desta época e o passeio é bastante agradável.
                Com a ilha agora sendo ocupada oficialmente por espanhóis, iniciou-se uma negociação diplomática entre Portugal e Espanha onde ficou acertada a devolução da Ilha de Santa Catarina à Coroa Portuguesa (em troca de outros territórios que você deve ter estudado nas aulas de história).
                Desterro volta a ser brasileira. Como ainda era parcamente povoada, assim como o resto do sul do Brasil, ainda com os incentivos aos bandeirantes, Portugal se aproveitou de uma inusitada superpopulação das ilhas dos Açores, por volta de 1700, para incentivar este pessoal a ocupar as áreas sulinas do Brasil. Porto Alegre é, hoje, a maior cidade açoriana do mundo. Florianópolis certamente é a segunda. Outras cidades foram colonizadas por este povo, que passaram a ser maioria no litoral sul do Brasil, na época.
                Passaram-se anos e Florianópolis, ainda chamada de Desterro, viveu pacatamente da agricultura, da pesca e da matança da baleia para o uso do seu óleo. Até que, finalmente, com a Independência do Brasil e a nomeação de Desterro como capital da província de Santa Catarina, os investimentos e a modernidade chegaram por aqui: Ponte Hercílio Luz, palácio do Governo, construções públicas, empregos. Ao final do século 19, finalmente a cidade veio a se chamar Florianópolis:  O então vice-presidente Floriano Peixoto assumiu a presidência à força depois da renúncia do primeiro presidente do Brasil, Marechal Deodoro e, por isto, sofreu uma forte oposição (segundo a constituição da época, o vice-presidente só servia para convocar novas eleições). Floriano Peixoto desceu a lenha nos opositores do Rio Grande do Sul e de Desterro. Sobraram apenas simpatizantes do presidente por aqui que, por conta própria, mudaram o nome da cidade em sua homenagem.
                E Florianópolis viveu décadas de marasmo e servidorismo público. Era a segunda menor capital do Brasil, atrás apenas de Aracaju. Até que a sede da Eletrosul se mudou do Rio de Janeiro para a Ilha. Foi uma importante e pioneira movimentação econômica, seguida de outras posteriores como a instalação da Universidade Federal de Santa Catarina (trazendo seu corpo docente quase todo do Rio Grande do Sul e do Paraná). Com mais gente e com maior potencial econômico, mais pessoas vieram suprir as novas demandas comerciais, vislumbrando a oportunidade de iniciar a vida em um lugar que ainda tinha tudo para ser feito.
                Floripa então prosperou dos anos 70 aos anos 2000, cercada de propagandas sobre sua invejável qualidade de vida, oportunidades e belezas naturais. O crescimento populacional vertical melhorou a vida de muita gente: tinham-se mais clientes, mais renda.
                Até que depois da preguiça e da falta planejamento para suprir a demanda que naturalmente viria com toda esta propaganda, a cidade mostra-se hoje problemática, superpopulosa e com todos os problemas que você, que mora aqui, enfrenta diariamente.
                E aí após séculos de invasão de tudo quanto é tipo de gente à Ilha, alguns míopes chegam à fácil conclusão de que os culpados são os novos forasteiros: “Ora, o problema é que muita gente de fora vem para cá passar as férias e acaba ficando, entupindo nossas ruas”, dizem. “Não há espaço para tanta gente. Vão embora!”. “Fora haole”...
                Às vezes tenho raiva desse tipo de gente, mas entendo que esta opinião é fruto da ignorância completa, a começar pela ausência de conhecimento básico em história. Várias regiões do Brasil passaram por migrações intensas diversas vezes. A Ilha de Santa Catarina, como tentei mostrar, já foi espanhola, acabou sendo fundada por paulistas, teve contribuição de cariocas e gaúchos e hoje contempla a chegada de profissionais do mundo inteiro na área de Tecnologia da Informação. Isto acontece e acontecerá cada vez mais no mundo inteiro, com o desenvolvimento dos transportes e das comunicações.
                Mas, se é para iniciar um processo de retirada da Ilha como propõem por aí, nós, descendentes de Paulistas, Cariocas, Gaúchos e Açorianos somos intrusos também. Deixemos o sossegado povo Carijó.